Na Revised Version [Versão Revisada] de 1881 um espaço é deixado entre o final do versículo 8 de Marcos 16 e o início do versículo 9, e uma nota marginal diz: “Os dois manuscritos gregos mais antigos e algumas outras autoridades omitem do verso 9 até o final. Algumas outras autoridades trazem um final diferente para o Evangelho”. Muitas versões mais recentes têm uma nota semelhante e, como resultado, muitos leitores modernos estão inclinados a assumir que esses versículos são espúrios.

Desde o tempo da segunda edição do Novo Testamento de Griesbach (1806), tem se tornado cada vez mais moda entre os eruditos bíblicos questionar a autenticidade de Marcos 16:9-20. Tem sido alegado que o testemunho dos manuscritos gregos e dos primeiros escritores cristãos torna impossível que consideremos estes versículos como sendo de Marcos. Também se argumentou que a diferença de vocabulário e estilo leva à mesma conclusão.

Sugere-se que a última porção do Evangelho tenha sido perdida em tempos primitivos e que o presente final foi adicionado posteriormente por outra mão. Antes de Griesbach, os estudiosos deixaram esses versículos no texto e defenderam sua autenticidade, ex.: Mill (1707), Bengel (1734), Wetstein (1751) e Alter (1787). Birch (1788) levantou a questão, mas manteve os versos em seu texto; Matthaei (1788) defendeu-os fortemente.

Griesbach sugeriu que, antes do fim do séc. II, o final atual foi adicionado por um escritor desconhecido e que toda uma família de manuscritos descendeu dessa fonte. Outras cópias existiam, de acordo com Griesbach, sem esses versos e deu origem ao grupo de manuscritos em que o Evangelho termina com as palavras “porque temiam”. Na opinião dele, apenas essas cópias representavam o texto autêntico.

Hug (1808) e Scholz (1830) defenderam a autenticidade dos versículos rejeitados por Griesbach. Lachmann adotou o princípio de confiar em um pequeno grupo dos manuscritos mais antigos (não obstante o caráter insatisfatório dessas testemunhas), desconsiderando todas as evidências posteriores. Seu texto apareceu em 1842 sem os versículos em disputa porque não eram encontrados no Códice Vaticanus e em algumas outras cópias antigas. Ele foi seguido por Tischendorf, Tregelles e Dean Alford. Tregelles não contestaria a inspiração dos versos, mas negava que fossem parte do Evangelho original – uma posição impossível de ser defendida.

O Arcebispo Thompson em sua obra Bible Dictionary [Dicionário Bíblico], T. S. Green em sua obra Developed Criticism [Crítica Desenvolvida], o Prof. Norton em sua obra Genuineness of the Gospels [A Genuinidade dos Evangelhos], o Prof. Westcott em sua obra Introduction to the Study of the Gospels [Introdução ao Estudo dos Evangelhos], e Meyer em sua obra Critical Commentary [Comentário Crítico] negam a autenticidade desses versículos. Seu exemplo foi seguido por muitos estudiosos do século XX, e seu veredito hostil foi aceito a menor sombra de dúvidas por muitos que professam ser cristãos evangélicos com respeito reverente pela inspiração e autoridade das Sagradas Escrituras.

Um novo exame da evidência demonstra que o veredito está errado e que os versos em disputa têm, abundantemente, o direito ao seu lugar no Evangelho segundo Marcos. É evidente que algum copista do séc. III. deixou uma cópia de Marcos inacabada e que a cópia imperfeita tornou-se a fonte do pequeno número de cópias defeituosas que foram preservadas em nossos tempos. A grande maioria dos manuscritos contém os versos em questão.

OS TESTEMUNHOS DOS ESCRITORES CRISTÃOS PRIMITIVOS

Com a exceção de alguns fragmentos, nossos manuscritos mais antigos são do séc. IV, mas os escritos de cem ou mais escritores de um período muito anterior estão disponíveis para testemunhar o conteúdo das cópias do Novo Testamento, muito mais anteriores do que qualquer manuscrito grego que agora possuem. Temos comparativamente poucas cópias do Novo Testamento no período de 300 a 600 d.C., mas cerca de duzentos escritores daquele período citam dos manuscritos então em existência, porém os tais não sobreviveram.

É verdade que muitos desses escritores citam vagamente e de memória, mas mesmo uma alusão muito geral a esses versículos seria uma prova suficiente de que o escritor antigo conhecia as palavras e as encontrou em cópias em uso. Essas alusões são encontradas:

  • nos escritos de Papias, em 100 d.C.
  • Justino Mártir em 151 d.C. cita o último verso dentre de um período de cinquenta anos da morte do último dos Apóstolos.
  • Irineu cita e comenta o versículo 19 em 180 d.C.
  • Hipólito cita os vs. 17 e 18 no período de 190-227 d.C.
  • Vincentius citou os vs. 17 e 18 no Sétimo Concílio de Cartago, em 256 d.C., na presença de oitenta e sete bispos africanos
  • cerca de 150 anos depois, Agostinho citou a mesma passagem.
  • o “Evangelho de Nicodemos” do séc. III d.C. contém os versículos 15, 16, 17, 18.
  • as “Constituições Apostólicas” dos séc. III e IV d.C., citam o v. 16 tal e qual jaz no Texto Recebido.
  • Eusébio, em 325 d.C., estava familiarizado com os últimos doze versículos.
  • a Homilia de Afraates, em 337 d.C., cita os versículos 16, 17, 18.
  • Ambrósio, arcebispo de Milão, em 374-97 d.C., cita os versículos 15, 16, 17, 18 e 20.
  • Crisóstomo, em 400 d.C., cita os versículos 19 e 20 e acrescenta: “Este é o fim do Evangelho”.
  • Jerônimo, em 331-420 d.C., retém a passagem disputada.
  • Nestório, o herege, cita o versículo 20.
  • Cirilo de Alexandria aceita a citação e comenta nela nalgum tempo antes de 430 d.C.
  • Vítor de Antioquia, em 425 d.C., dá testemunho enfático da genuinidade dessa passagem.

Essas autoridades pertencem a todas as partes da igreja primitiva e várias delas são de data mais antiga do que os nossos manuscritos mais antigos.

Os críticos modernos citam Gregório de Nissa, Hésiquio, Severo de Antioquia, Eusébio, Vitor de Antioquia e Jerônimo como hostis a Marcos 16:9-20. Mas Gregório e Severo apenas citam as palavras de Hésiquio; Vítor cita Eusébio e o refuta; e Jerônimo apenas traduz, mas não aprova as palavras de Eusébio. Nós ficamos, assim, apenas com Eusébio, e um exame de seu testemunho indica que ele não negou que as palavras em disputa estavam em muitos manuscritos de seu tempo. Eusébio mencionou que, devido às aparentes discrepâncias entre as partes finais dos Evangelhos, algumas pessoas estavam inclinadas a excluir o versículo final de Marcos. Vítor afirma claramente que as palavras haveriam de ser encontradas na cópia palestina de Marcos.

O TESTEMUNHO DAS VERSÕES ANTIGAS

O Novo Testamento foi traduzido em um período muito anterior para o sírio, o latim, o gótico, o egípcio, etc. Algumas dessas traduções foram feitas a partir de cópias gregas mais antigas que as que qualquer um de nós já possuímos. Elas podem, portanto, nos dizer o que os estudiosos encontraram em seu Novo Testamento antes do tempo de nossos manuscritos mais antigos. Na Peshita siríaca do séc. II, na siríaca curetoniana do séc. III, na siríaca filoxeniana do séc. V, na antiga latina de Jerônimo do séc. IV, na antiga latina do séc. II, na gótica do séc. IV, na egípcia do séc. IV ou V, na tebaica do séc. III, algumas cópias da armênia do século V – em todas essas traduções antigas, temos evidências de que os tradutores encontraram os versos em disputa incluídos nas cópias gregas disponíveis para eles. A maior parte dessas traduções antigas foram feitas muito antes das cópias Vaticanus e Sinaiticus serem escritas. As cópias gregas usadas pelos tradutores nos séc. II e III continham os últimos doze versos, enquanto as cópias gregas usadas pelos copistas do Vaticano e do Sinai no séc. IV estavam incompletas.

O TESTEMUNHO DOS MANUSCRITOS GREGOS

A grande maioria dos manuscritos contém as palavras em disputa, mas duas cópias muito antigas as omitem, ou seja, o Codex Vaticanus e o Codex Sinaiticus, ambos do século IV. Um estudioso do século XIX examinou vinte antigos manuscritos unciais e cerca de seiscentos cursivos e encontrou apenas esses dois em desacordo com o Texto Recebido.

Os códices Alexandrinus e C, talvez cinquenta anos mais tarde do que o Vaticanus e o Sinaiticus, contêm esses versículos. O Códice Beza (D), frequentemente de acordo com os dois manuscritos defectivos, em partes os acompanha aqui e inclui os versículos. É claro que os manuscritos do Sinai e do Vaticano exibem um texto mutilado neste trecho, assim como o fazem em muitas outras passagens.

Estes dois manuscritos, apesar de antigos, são, em muitos aspectos, defectivos e não confiáveis, escritos descuidadamente com numerosas omissões. O Manuscrito do Vaticano, somente nos Evangelhos, omite palavras e orações em quase mil e quinhentas vezes; a maior parte destas omissões é encontrada em Marcos. O codex Sinaiticus é abundante de “erros de observação e de escrita, até certo ponto sem paralelo, mas felizmente incomuns em documentos de primeira importância”.1 Estes dois documentos exibem sinais de origem comum em uma cópia defeituosa anterior.

FALSAS TESTEMUNHAS

A cópia do Vaticano pára no final do versículo 8, mas o copista deixou um espaço em branco suficiente para acomodar os versículos que faltavam. Parece provável que o copista soubesse que havia uma parte faltando na cópia diante dele.

Na cópia do Sinai, a página dupla que contém o final de Marcos e o início de Lucas foi removida em uma data anterior e substituída pelos quatro lados reescritos para excluir Marcos 16:9-20. Ao aumentar ligeiramente o tamanho das letras e espaços, o escritor conseguiu ampliar sua versão abreviada até o topo da coluna anterior a Lucas 1. Ele completou o restante de sua última linha com um floreio ornamental para garantir que nenhuma adição pudesse ser feita sem ficar imediatamente evidente. Tischendorf, o descobridor do códice do Sinai, alegou que essas páginas foram escritas pelo copista do manuscrito do Vaticano. A evidência parece indicar nada mais do que alguns primeiros manuscritos que terminaram dessa maneira, mas que os próprios copistas estavam conscientes da omissão. Estes dois manuscritos são falsas testemunhas.

NOTAS EM CÓPIAS ANTIGAS

Os críticos nos asseguram que muitos manuscritos antigos contêm uma nota indicando que Marcos 16:9-20 estava ausente em muitas outras cópias. Os estudiosos foram vistos citando seus predecessores sem verificar a precisão deles. Assim, Tregelles alega que, em vinte e cinco cópias, uma nota indica que esses versículos estão faltando nas cópias mais corretas. Esta afirmação parece ter sido citada em segunda mão por Griesbach e Scholz (1830). Scholz citou erroneamente Griesbach e Griesbach citou erroneamente Wetstein (1751) e Birch.

Por exemplo, Scholz copia Griesbach, que diz que dois manuscritos em Roma têm um asterisco contrário a Marcos 16:9-20. As investigações mostram que não há um asterisco, mas um símbolo que remete o leitor para uma nota em outra página, onde existe uma marca similar, ali fica plenamente claro que a passagem é genuína. Há também uma nota, indicando que o texto foi coletado com as cópias antigas e aprovadas em Jerusalém.

Scholz diz que os códices 23, 34, 39 e 41 contêm uma nota de Severo de Antioquia de que as “cópias mais precisas terminam no verso 8”. Outros seguiram cegamente. O codex 23 não possui tal nota. O codex 41 tem uma nota com o efeito oposto – que as cópias mais precisas contêm os versos. Os códices 34 e 39 não possuem tal nota. Quando Tischendorf, Tregelles e seus sucessores e imitadores nos dizem que trinta manuscritos contêm uma nota que lança a dúvida em Marcos 16:9-20, estão repetindo os erros dos outros. A maioria dos manuscritos então referidos contém uma nota confirmando a inclusão dos versos. Os críticos não podem fornecer provas de que o Evangelho segundo Marcos, ao deixar as mãos de seu autor, estava imperfeito ou inacabado.

O ARGUMENTO DE ESTILO E VOCABULÁRIO

Alguns estudiosos modernos nos dizem que as características de estilo e vocabulário de Marcos estão ausentes nesta passagem. Eles estão completamente errados. É presunçoso arriscar uma avaliação do estilo de um escritor à partir de doze versos, especialmente se o assunto for exclusivo e não puder ser comparado com parágrafos anteriores acerca do mesmo tópico. Por exemplo, os cinco primeiros versículos de Lucas são diferentes de qualquer coisa no resto do seu Evangelho; o mesmo pode ser dito sobre os cinco primeiros versos de João. Nenhum crítico está qualificado para julgar tais tênues evidências.

Os críticos imaginam que a mudança da descrição detalhada para notas breves ligeiramente vinculadas em Marcos 16:9-20 indica uma mudança de autoria. Por qual motivo? Certamente, um escritor que poderia dar uma descrição detalhada de um milagre seria capaz de dar uma breve sinopse dos eventos após a crucificação, quando havia muitos assuntos muito diferentes a serem abordados. Na verdade, é possível demonstrar grandes semelhanças de estilo entre Marcos 16:9-20 e Marcos 1:9-20.

1) Alford nos aponta para 16:9 πρὡτῃ σαββἁτου (prote sabbatou) em referência ao primeiro dia da semana em comparação com μιᾶς σαββάτων (mias sabbaton) em 16:2. Mas quando comparamos isso com Lucas 6:1,2,5,6,7 e 9 encontramos quatro vezes σαββάτων (sabbaton), duas vezes τά σάββατα (ta sabbata), duas vezes σαββάτων (sabbaton), duas vezes ἡ ἡμέρα τῶν σαββάτων (he hemera tou sabbatou), uma vez τά σάββατα (ta sabbata). Casos similares poderiam ser multiplicados à vontade.

Também deve ser notado que o μία τῶν σαββάτων (mias sabbaton) de Marcos 16:2 ocorre apenas uma vez em cada Evangelho. Era uma expressão comum na Palestina, mas não tão comum em Roma e em outros lugares. Pensa-se que Marcos escreveu seu relato em Roma e parece provável que ele tenha sido movido pelo Espírito para usar ambas as expressões, uma que elucide a outra.

2) 16:9 “da qual tinha expulsado sete demônios”. É salientado que Maria Madalena foi mencionada três vezes sem essa afirmação e que o escritor provavelmente tirou isso de Lucas 8:2 – mas a ordem é diferente em Lucas e Lucas foi escrito depois de Marcos. Compare com João 20:2, onde João se menciona sem comentar como o “outro discípulo a quem Jesus amava” e, em seguida, no 20. O versículo 20 acrescenta “e que na ceia se recostara também sobre o seu peito”. Ninguém sugere que João 21:20 seja espúrio por esse motivo.

3) 16:10, 12 e 15: πορεύεσθαι (poreuesthai) ocorre três vezes em 16:9-20 (partindo, iam, ide), mas em nenhum outro lugar em Marcos. Por conseguinte, nos dizem que esta porção não poderia ter sido escrita por Marcos. Mas Marcos usa formas compostas deste verbo vinte e quatro vezes em comparação com um total de dezenove em Mateus, Lucas e João juntos. O uso da palavra nestes três versos no final do capítulo 16 deve ser considerado como prova de sua autenticidade.

4) 16:15 “a toda criatura”. Os críticos dizem que este grego é paulino – mas Paulo o apresenta-o apenas uma vez, em Romanos 8:22. Então, por que Marcos não deveria apresentar uma vez em 16:15? A palavra usada para ‘criatura’ é usada por Marcos em 10:6 e 13:19 e não é usada por Mateus, Lucas nem João. Sua presença aqui prova a autenticidade da passagem.

5) 16:19, 20: “o Senhor”. Diz-se que isto é estranho a Marcos e, portanto, é espúrio. Mas Marcos o chama de “Jesus Cristo” apenas uma vez em Marcos 1:1. O mesmo se aplica a Mateus e João, mas ninguém duvida da autenticidade desses capítulos porque eles contêm uma expressão única.

6) 16:19 “foi recebido”. Este verbo grego nos é informado que não ocorre em nenhum outro lugar nos Evangelhos. Mas Marcos usa setenta e quatro verbos que não são encontrados em nenhum outro lugar nos Evangelhos e este é um deles. Em qualquer caso, Marcos está descrevendo algo que não foi referido anteriormente e a palavra é apropriada para a ascensão do nosso Senhor.

7) A ausência de εὐθὲως eutheos (logo, imediatamente) e πάλιν palin (novamente), ambos frequentes em Marcos, é citado como evidência de que esta porção é espúria. Este argumento é inútil, pois “imediatamente” é encontrado doze vezes no capítulo 1, seis vezes no capítulo 5, cinco vezes nos capítulos 4 e 6, etc., mas apenas uma vez nos capítulos 3, 8, 10 e 15 e nenhuma vez nos capítulos 12, 13 e 16.

“Novamente” é visto seis vezes no capítulo 14, cinco vezes no capítulo 10, etc., mas apenas uma vez nos capítulos 4 e 5 e nenhuma nos capítulos 1, 6, 9, 13 e 16. Devemos rejeitar todos estes capítulos porque eles não contêm essas pequenas palavras? Os críticos não sugerem que devamos, mas insistem em que rejeitemos Marcos 16:9-20 com evidências tão sem sentido.

AS PALAVRAS CARACTERÍSTICAS DE MARCOS ENCONTRADAS NESTES VERSOS

8) “manhã” em 16:9: Marcos usa essa palavra grega seis vezes, muito mais frequentemente do que Mateus ou João. Lucas nunca a usa.

9) “pregai o Evangelho” em 16:15: Marcos e Mateus usam a expressão quatro vezes, Lucas e João nenhuma.

‘Pregar’ (κηρύσσειν – kerussein): Marcos traz duas vezes mais do que Mateus e três vezes com mais frequência que Lucas.

‘Evangelho’ (εὐαγγελίῳ – evangelio): Marcos traz duas vezes mais que Mateus.

10) “manifestou-se” (φανεροῦται – phanerousthai) em 16:12, 14: usado também por Marcos em 4:22, mas nunca por Mateus ou Lucas.

11) “dureza do coração” em 16:14: nunca usado por Lucas ou João, por Mateus apenas uma vez, por Marcos duas vezes, incluindo este verso.

12) “por todas as partes” (πανταχοῦ – pantachou) em 16:20: nunca usado por Mateus ou João, apenas uma vez por Lucas, duas vezes por Marcos, incluindo este verso. Ele também usa uma palavra relacionada em 1:45.

13) “e sararão” (καλῶς ἕξουσιν – kalos exousin) é característico de Marcos.

14) “será condenado” (κατακρίνω katakrino não κρίνω krino): a forma simples é frequentemente usada pelo outros evangelistas, vinte e oito vezes, mas nunca por Marcos, que usa a forma composta do verbo mais comum do que todos os outros. Assim, é encontrado em 16:16 e é característico de Marcos.

Outros casos podem ser dados, mas estes são suficientes para demonstrar que os argumentos de estilo e vocabulário contra a autenticidade são destituídos de fundamentos. A evidência prova a autenticidade da passagem.

COMPARAÇÃO DE MARCOS 16:9-20 E 1:9-20

Existe um paralelismo essencial entre Marcos 16:9-20 e Marcos 1:9-20 – a manifestação do Senhor ao mundo, a vitória sobre Satanás, os dons do Espírito Santo, a pregação do Evangelho, o Reino de Deus, o chamado ao ministério – uma indicação que o Espírito Santo era o Autor do fim, bem como o início do Evangelho e que Marcos era o escritor de ambos.

OS LECIONÁRIOS

Em tempos muito primitivos era a prática marcar as porções dos evangelhos nomeados para ser lidos no culto público. É evidente que, antes do Concílio de Niceia, as cópias dos Evangelhos assim marcadas e incluindo os versos em disputa estavam em uso em todo o mundo cristão e que esses doze versos foram designados para serem lidos nos dias que comemoram a ressurreição e a ascensão. Muitas cópias foram escritas especialmente para leitura pública e outras cópias comuns tiveram uma nota adicionada na margem antes e depois de cada leitura.

Por exemplo, em algumas cópias antigas de Lucas, há uma nota na margem instruindo o leitor público a omitir os versículos 43 e 44 do capítulo 22 ao ler a lição para a terça-feira após a “Sexagasima” porque esses versículos foram lidos após Mateus 26:39 como parte da lição para a quinta-feira antes da Páscoa. Como resultado, esses versículos de Lucas 22 são omitidos em algumas cópias. Em muitas cópias antigas marcadas para leitura pública, a palavra grega para ‘princípio’ (ἀρχῇ – arche) aparece em forma abreviada na margem ou no texto em tinta vermelha onde a lição começa, e telos (fim) em vermelho no final da lição; por exemplo, em Marcos 14:41 lemos “[…] basta, a hora chegou […]”. O codex D do século IV e vários outros leem: “basta, o fim e a hora chegaram […]”. A nota marginal telos ‘o fim’ indicou que a lição a ser lida deve terminar após o versículo 42, mas o copista colocou a nota no texto do versículo 41 e estabeleceu um exemplo que outros seguiram.

É provável que uma cópia anterior de Marcos incluiu todo o capítulo 16 com uma nota marginal após o versículo 8 para indicar que a lição para o segundo domingo após a Páscoa tinha que terminar ali. Um copista mais tarde interpretou mal a nota marginal como se seu significado fosse que todo o Evangelho terminou no versículo 8 e que as palavras restantes não faziam parte do Evangelho. Este erro foi repetido em várias cópias, das quais os manuscritos defeituosos já mencionados são exemplos.

No codex 24 há bem poucas notas, mas claramente escritas após o versículo 8, encontramos o telos e novamente telos depois do versículo 20.

INFLUÊNCIA DE ORÍGENES

O comentário de Eusébio apenas significava que algumas cópias não tinham os versos 9-20, que a maioria das cópias tinha telos “o fim” após o versículo 8 (assim como o versículo 20) e que algumas pessoas estavam prontas para resolver o problema das aparentes discrepâncias entre Marcos e os outros evangelistas, rejeitando o lecionário em que os versículos disputados são encontrados. Eusébio provavelmente emprestou essa sugestão dos escritos anteriores de Orígenes, que aparentemente estavam familiarizados com manuscritos defeituosos, como as cópias do Vaticano e do Sinai.

A EXPLICAÇÃO MAIS PROVÁVEL

Algumas cópias antigas do evangelho quádruplo está na ordem Mateus, João, Lucas, Marcos. Isto é encontrado no codex Beza (D) e em vários outros. Se, em qualquer momento, essa cópia tivesse Marcos 16:8 ao pé da última página, exceto em uma, e os versos restantes na última página, essa porção teria sido a mais exposta a danos e perdas. Se telos fosse escrito após o versículo 8 em tal cópia, um copista posterior concluiria que ele tinha todo o Evangelho diante de si e deixaria a nova cópia sem o seu próprio final.

RESUMO

1) Embora muitos estudiosos do século XIX e XX rejeitem esses versículos, estamos mais preocupados em saber o que os leitores encontraram em seus novos testamentos nos séculos I, II, III e IV, e há evidências esmagadoras de que os versos foram incluídos em cópias mais antigas.

2) As duas cópias mais antigas agora sobreviventes não são representantes confiáveis do texto da Sagrada Escritura usado nos tempos primitivos, e nesta passagem eles exibem um texto mutilado.

3) A maioria das cópias antigas, a maioria dos escritores antigos e a maioria das traduções antigas atestam a autenticidade desses versículos.

4) Os argumentos do estilo e do vocabulário, longe de levar à rejeição desses versículos, realmente confirmam sua autenticidade.

5) Existem explicações simples e óbvias para a ausência desses versículos em algumas cópias antigas. Esses incluem:

a) A antiga inserção do “fim” após uma leitura do lecionário.

b) A antiga ordem dos Evangelhos, com Marcos por último, deixava a última página vulnerável.

CONCLUSÃO

Esses versículos em disputa fazem parte da Santa Palavra de Deus inspirada e devem ser recebidos com reverência por toda a igreja de Deus.

Na sua determinação de defender a superioridade das cópias do Vaticano e do Sinai, os eruditos bíblicos dos séculos XIX e XX elevaram estes documentos a um trono de autoridade suprema, com o resultado de que estes últimos doze versos são conservados nas versões modernas apenas como um adição tardia e espúria ao texto original.

Nós defendemos um terreno infinitamente mais firme quando insistimos que todo o Evangelho de Marcos – desde o primeiro versículo do primeiro capítulo até o final do versículo 20 do capítulo 16 – foi dado por inspiração de Deus e deve ser respeitado como parte integrante da revelação divina.

Publicado por:
Sociedade Bíblica Trinitariana de Londres
15 Lyon Road, Londres.
SW19 2RL Inglaterra
William Tyndale House

Publicado em: <https://www.tbsbibles.org/page/Mark16>

Traduzido por Ícaro Alencar de Oliveira em 22 de novembro de 2017, em Rio Branco, Acre, Brasil. 2ª edição revisada da tradução, em 09 de novembro de 2023, em Rio Branco, Acre, Brasil.

NOTAS

  1. John W. Burgon, The Last Twelve Verses of the Gospel According to S. Mark [Os últimos doze versículos do Evangelho segundo S. Marcos] (Oxford, England: James Parker and Co., 1871), p. 98. ↩︎

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