Por Walter Campelo

“E, quando havendo faltado suco de uva, a mãe de Jesus Lhe diz: ‘Não (mais) têm suco de uva’. (Mas) diz-lhe Jesus: “Que tenho Eu contigo, ó mulher?  Ainda não é chegada a Minha hora.” (Jo 2.3-4 LTT)

*Jo 2:9 “SUCO DE UVA”: o grego {oinos} e o hebraico {yayin} se equivalem e, de acordo com o contexto em que ocorram, podem se referir a qualquer líquido que direta ou indiretamente provenha da uva: suco (recém espremido, como em (Gn 40:11); ou suco não concentrado mas conservado por “pasteurização” e/ou esterilização por fumos de enxofre queimando, seguidos de lacramento hermético; ou suco concentrado (por evaporação) a 1/5 ou 1/10 do volume inicial, até formar grosso xarope a ser consumido por diluição em água); ou vinho alcoólico; ou vinagre de uva. Quer alcoólico ou não, o líquido não concentrado proveniente da uva somente deveria ser usado misturado em 5 a 10 partes de água (20 a 100 partes de água, se fosse xarope concentrado) (mas bêbados consumiam vinho alcoólico sem diluí-lo, e grosseiros glutões / esbanjadores consumiam o suco não concentrado sem diluí-lo, e suco concentrado diluindo-o somente em 10 ou 5 partes de água). Estamos convictos que o presente verso se refere ao puro suco de uva. O livro “Bible Wines: or, The Laws of Fermentation and Wine of the Ancients”, de William Patton, apresenta profundíssima e detalhada análise científico técnica, histórica, gramatical e exegética do assunto, analisando todos os versos onde aparecem palavras relacionadas com vinho. – (Bíblia LTT)

A Palestina, antiga Canaã, sempre foi um dos maiores produtores de uva do mundo (Nm 13.23). Por isso, seus moradores produziam diversos tipos de vinho, ou seja, com e sem fermento, azedo, etc. No versículo em apreço (2.3), encontramos o termo grego “oinos” (suco), “yayin” (hebraico), diferente de “sikera” (palavra semítica) e “shêkhâr” (hebraico) que significam “bebida forte”, alcoolizada (Lc 1.15), e “gleucos” (grego) “bebida embriagante” (At 2.13). O vinho sem fermento (“oinos”) era muito apreciado por todos, pois, além de estimulante do apetite, era um fortificante para o sangue e alimento protético para o organismo…. O Filho de Deus fez questão de estabelecer o fruto da vide (“oinos”) como símbolo do seu sangue que ia ser derramado, para a remissão de nossos pecados (Mt 26.27-29; 1 Co 11.25).” 

Introdução

VINHO: FERMENTADO OU NÃO FERMENTADO?

“Porque veio João o Batista, que não comia pão nem bebia vinho, e dizeis: Tem demônio; Veio o Filho do homem, que come e bebe, e dizeis: Eis aí um homem comilão e bebedor de vinho, amigo dos publicanos e pecadores” (Lucas 7:33-34 ACF)

● Segue-se um exame da palavra bíblica mais comumente usada para vinho. A palavra grega para “vinho”, em (Lc 7.33), é ‘oinos’. Oinos pode referir-se a dois tipos bem diferentes de suco de uva:

1)suco não fermentado, e
2) vinho fermentado ou embriagante. Esta definição apóia-se nos dados abaixo.

1°) A palavra grega ‘oinos’ era usada pelos autores seculares e religiosos, antes da era cristã e nos tempos da igreja primitiva, em referência ao suco fresco da uva (ver Aristóteles, Metereologica, 387.b.9-13).

a) Anacreontes (c. de 500 a.C.) escreve: “Esprema a uva, deixe sair o vinho [oinos]” (Ode 5).

b) Nicandro (século II a.C.) escreve a respeito de espremer uvas e chama de oinos o suco daí produzido (Georgica, fragmento 86).

c) Papias (60-130 d.C.), um dos pais da igreja primitiva, menciona que quando as uvas são espremidas produzem “jarros de vinho [oinos]” (citado por Ireneu, Contra as Heresias, 5.33.3–4).

d) Uma carta em grego escrita em papiro (P. Oxy. 729; 137 d.C.), fala de “vinho [oinos] fresco, do tanque de espremer” (ver Moulton e Milligan, The Vocabulary of the Greek Testament, p. 10).

e) Ateneu (200 d.C.) fala de um “vinho [oinos] doce”, que “não deixa pesada a cabeça” (Ateneu, Banquete, 1.54). Noutro lugar, escreve a respeito de um homem que colhia uvas “acima e abaixo, pegando vinho [oinos] no campo” (1.54). Para considerações mais pormenorizadas sobre o uso de oinos pelos escritores antigos, ver Robert P. Teachout: “O Emprego da Palavra ‘Vinho’ no Antigo Testamento”. (Dissertação de Th.D. no Seminário Teológico de Dallas, 1979).

2°) Os eruditos judeus que traduziram o AT do hebraico para o grego c. de 200 a.C. empregaram a palavra oinos para traduzir várias palavras hebraicas que significam vinho. Noutras palavras, os escritores do NT entendiam que ‘oinos’ pode referir-se ao suco de uva, com ou sem fermentação.

3°) Quanto a literatura grega secular e religiosa, um exame de trechos do NT também revela que oinos pode significar vinho fermentado, ou não fermentado. Em (Ef 5.18), o mandamento: “não vos embriagueis com vinho [oinos]” refere-se ao vinho alcoólico. Por outro lado, em (Ap 19.15) Cristo é descrito pisando o lagar. O texto grego diz: “Ele pisa o lagar do vinho [oinos]”; o oinos que sai do lagar é suco de uva cf. (Is 16.10 nota; Jr 48.32,33 nota). Em Ap 6.6, ‘oinos’ refere-se às uvas da videira como uma safra que não deve ser destruída. Logo, para os crentes dos tempos do NT, “vinho” (oinos) era uma palavra genérica que podia ser usada para duas bebidas distintivamente diferentes, extraídas da uva: o vinho fermentado e o não fermentado.

4°) Finalmente, os escritores romanos antigos explicam com detalhes vários processos usados para tratar o suco de uva recém-espremido, especialmente as maneiras de evitar sua fermentação.

a) Columela (Da Agricultura, 12.29), sabendo que o suco de uva não fermenta quando mantido frio (abaixo de 10 graus C.) e livre de oxigênio, escreve da seguinte maneira: “Para que o suco de uva sempre permaneça tão doce como quando produzido, siga estas instruções: Depois de aplicar a prensa às uvas, separe o mosto mais novo [i.e., suco fresco], coloque-o num vasilhame (amphora) novo, tampe-o bem e revista-o muito cuidadosamente com piche para não deixar a mínima gota de água entrar; em seguida, mergulhe-o numa cisterna ou tanque de água fria, e não deixe nenhuma parte da ânfora ficar acima da superfície. Tire a ânfora depois de quarenta dias. O suco permanecerá doce durante um ano” (ver também Columela: Agricultura e Árvores; Catão: Da Agricultura). O escritor romano Plínio (século I d.C.) escreve: “Tão logo tiram o mosto [suco de uva] do lagar, colocam-no em tonéis, deixam estes submersos na água até passar a primeira metade do inverno, quando o tempo frio se instala” –  (Plínio, História Natural, 14.11.83). Este método deve ter funcionado bem na terra de Israel cf. (Dt 8.7; 11.11,12; Sl 65.9-13).

b) Outro método de impedir a fermentação das uvas é fervê-las e fazer um xarope. Historiadores antigos chamavam esse produto de “vinho” (oinos). O Cônego Farrar (Smith’s Bible Dictionary, p. 747) declara que “os vinhos assemelhavam-se mais a xarope; muitos deles não eram embriagantes”. Ainda,

▪︎ O Novo Dicionário da Bíblia , observa que “sempre havia meios de conservar doce o vinho durante o ano inteiro”.

O USO DO VINHO NA CEIA DO SENHOR.

▪︎ Jesus usou uma bebida fermentada ou não fermentada de uvas, ao instituir a Ceia do Senhor cf. (Mt 26.26-29; Mc 14.22-25; Lc 22.17-20; 1Co 11.23-26)? Os dados abaixo levam à conclusão de que Jesus e seus discípulos beberam no dito ato suco de uva não fermentado.

1°) Nem Lucas nem qualquer outro escritor bíblico emprega a palavra “vinho” (gr. oinos) no tocante à Ceia do Senhor. Os escritores dos três primeiros Evangelhos empregam a expressão “fruto da vide” (Mt 26.29; Mc 14.25; Lc 22.18). O vinho não fermentado é o único “fruto da vide” verdadeiramente natural, contendo aproximadamente 20% de açúcar e nenhum álcool. A fermentação destrói boa parte do açúcar e altera aquilo que a videira produz. O vinho fermentado não é produzido pela videira.

2°) Jesus instituiu a Ceia do Senhor quando Ele e seus discípulos estavam celebrando a Páscoa. A lei da Páscoa em (Êx 12.14-20) proibia, durante a semana daquele evento, a presença de seor (Êx 12.15), palavra hebraica para fermento ou qualquer agente fermentador. Seor, no mundo antigo, era freqüentemente obtido da espuma espessa da superfície do vinho quando em fermentação. Além disso, todo o hametz (i.e., qualquer coisa fermentada) era proibido (Êx 12.19; 13.7). Deus dera essas leis porque a fermentação simbolizava a corrupção e o pecado cf. (Mt 16.6,12; 1Co 5.7,8). Jesus, o Filho de Deus, cumpriu a lei em todas as suas exigências (Mt 5.17). Logo, teria cumprido a lei de Deus para a Páscoa, e não teria usado vinho fermentado.

3°) Um intenso debate perpassa os séculos entre os rabinos e estudiosos judaicos sobre a proibição ou não dos derivados fermentados da videira durante a Páscoa. Aqueles que sustentam uma interpretação mais rigorosa e literal das Escrituras hebraicas, especialmente (Êx 13.7), declaram que nenhum vinho fermentado devia ser usado nessa ocasião.

4°) Certos documentos judaicos afirmam que o uso do vinho não fermentado na Páscoa era comum nos tempos do NT. Por exemplo: “Segundo os Evangelhos Sinóticos, parece que no entardecer da quinta-feira da última semana de vida aqui, Jesus entrou com seus discípulos em Jerusalém, para com eles comer a Páscoa na cidade santa; neste caso, o pão e o vinho do culto de Santa Ceia instituído naquela ocasião por Ele, como memorial, seria o pão asmo e o vinho não fermentado do culto Seder” – (Jesus | The Jewish Encyclopaedia | edição de 1904 | V.165).

5°) No AT, bebidas fermentadas nunca deviam ser usadas na casa de Deus, e um sacerdote não podia chegar-se a Deus em adoração se tomasse bebida embriagante cf. (Lv 10.9). Jesus Cristo foi o Sumo Sacerdote de Deus do novo concerto, e chegou-se a Deus em favor do seu povo (Hb 3.1; 5.1-10).

6°) O valor de um símbolo se determina pela sua capacidade de conceituar a realidade espiritual. Logo, assim como o pão representava o corpo puro de Cristo e tinha que ser pão asmo (i.e., sem a corrupção da fermentação), o fruto da vide, representando o sangue ncorruptível de Cristo, seria melhor representado por suco de uva não fermentado cf. (1Pe 1.18,19). Uma vez que as Escrituras declaram explicitamente que o corpo e sangue de Cristo não experimentaram corrupção (Sl 16.10; At 2.27; 13.37), esses dois elementos são corretamente simbolizados por aquilo que não é corrompido nem fermentado.

7°) Paulo determinou que os coríntios tirassem dentre eles o fermento espiritual, i.e., o agente fermentador “da maldade e da malícia”, porque Cristo é a nossa Páscoa (1Co 5.6-8). Seria contraditório usar na Ceia do Senhor um símbolo da maldade, i.e., algo contendo levedura ou fermento, se considerarmos os objetivos dessa ordenança do Senhor, bem como as exigências bíblicas para dela participarmos.

***
Conclusão

O VINHO: MISTURADO OU INTEGRAL?

“Este primeiro dos Seus sinais Jesus fez em Caná da Galileia, e (ali) (pela primeira vez) manifestou a Sua glória. E os Seus discípulos creram para dentro dEle” (Jo 2.11 LTT)

● Os dados históricos sobre o preparo e uso do vinho pelos judeus e por outras nações no mundo bíblico mostram que o vinho era:

a) freqüentemente não fermentado; e
b) em geral misturado com água.

▪︎ O presente estudo menciona dois outros processos de preparação da uva para posteriormente ser misturada com água.

1°) Um dos métodos era desidratar as uvas, borrifá-las com azeite para mantê-las úmidas e guardá-las em jarras de cerâmica (Enciclopédia Bíblica Ilustrada de Zondervan, V. 882; ver também Columella, Sobre a Agricultura 12.44.1-8). Em qualquer ocasião, podia-se fazer uma bebida muito doce de uvas assim conservadas. Punha-se-lhes água e deixava-as de molho ou na fervura. Políbio afirmou que as mulheres romanas podiam beber desse tipo de refresco de uva, mas que eram proibidas de beber vinho fermentado – (Políbio, Fragmentos, 6.4; cf. Plínio, História Natural, 14.11.81).

2°) Outro método era ferver suco de uva fresco até se tornar em pasta ou xarope grosso (mel de uvas); este processo deixava-o em condições de ser armazenado, ficando isento de qualquer propriedade inebriante por causa da alta concentração de açúcar, e conservava a sua doçura  – (Columella, Sobre a Agricultura, 12.19.1-6; 20.1-8; Plínio, História Natural, 14.11.80). Essa pasta ficava armazenada em jarras grandes ou odres. Podia ser usada como geléia para passar no pão, ou dissolvida em água para voltar ao estado de suco de uva –  (Enciclopédia Bíblica Ilustrada, de Zondervan, V. 882-884). É provável que a uva fosse muito cultivada para produção de açúcar. O suco extraído no lagar era engrossado pela fervura até tornar-se em líquido conhecido como “mel de uvas”  – (Enciclopédia Geral Internacional da Bíblia, V. 3050). Referências ao mel na Bíblia freqüentemente indicam o mel de uva (chamado debash pelos judeus), em vez do mel de abelha.

3°) A água, portanto, pode ser adicionada a uvas desidratadas, ao xarope de uvas e ao vinho fermentado. Autores gregos e romanos citavam várias proporções de mistura adotadas. Homero (Odisséia, IX 208ss.) menciona uma proporção de vinte partes de água para uma parte de vinho. Plutarco (Symposíacas, III.ix) declara: “Chamamos vinho diluído, embora o maior componente seja a água”. – Plínio (História Natural, XIV.6.54) menciona uma proporção de oito partes de água para uma de vinho.

4°) Entre os judeus dos tempos bíblicos, os costumes sociais e religiosos não permitiam o uso de vinho puro, fermentado ou não. O Talmude (uma obra judaica que trata das tradições do judaísmo entre 200 a.C. e 200 d.C.) fala, em vários trechos, da mistura de água com vinho (e.g., Shabbath 77a; Pesahim 1086). Certos rabinos insistiam que, se o vinho fermentado não fosse misturado com três partes de água, não podia ser abençoado e contaminaria quem o bebesse. Outros rabinos exigiam dez partes de água no vinho fermentado para poder ser consumido.

5°) Um texto interessante temos no livro de Apocalipse, quando um anjo, falando do “vinho da ira de Deus”, declara que ele será “não misturado”, i.e., totalmente puro (Ap 14.10). Foi assim expresso porque os leitores da época entendiam que as bebidas derivadas de uvas eram misturadas com água cf. (Jo 2.3).

Em resumo, o tipo de vinho usado pelos judeus nos dias da Bíblia não era idêntico ao de hoje. Tratava-se de

a) suco de uva recém-espremido;
b) suco de uva assim conservado;
c)suco obtido de uva tipo passas;
d) vinho de uva feito do seu xarope, misturado com água; e
e) vinho velho, fermentado ou não, diluído em água, numa proporção de até 20 para 1. Se o vinho fermentado fosse servido não diluído, isso era considerado indelicadeza, contaminação e não podia ser abençoado pelos rabinos.

À luz desses fatos, é ilícita a prática corrente de ingestão de bebidas alcoólicas com base no uso do “vinho” pelos judeus dos tempos bíblicos. Além disso, os cristãos dos dias bíblicos eram mais cautelosos do que os judeus quanto ao uso do vinho cf. (Rm 14.21; 1Ts 5.6; 1Tm 3.3 nota; Tt 2.2).

A GLÓRIA DE JESUS MANIFESTA ATRAVÉS DO VINHO

Em Jo 2, vemos que Jesus transformou água em “vinho” nas bodas de Caná. Que tipo de vinho era esse? Conforme já vimos, podia ser fermentado ou não, concentrado ou diluído. A resposta deve ser determinada pelos fatos contextuais e pela probabilidade moral. A posição desta Bíblia de Estudo é que Jesus fez vinho (oinos) suco de uva integral e sem fermentação. Os dados que se seguem apresentam fortes razões para rejeição da opinião de que Jesus fez vinho embriagante.

1°) O objetivo primordial desse milagre foi manifestar a sua glória (Jo 2.11), de modo a despertar fé pessoal e a confiança em Jesus como o Filho de Deus, santo e justo, que veio salvar o seu povo do pecado cf. (2.11; Mt 1.21). Sugerir que Cristo manifestou a sua divindade como o Filho Unigênito do Pai (Jo 1.14), mediante a criação milagrosa de inúmeros litros de vinho embriagante para uma festa de bebedeiras (Jo 2.10 nota; onde subentende-se que os convidados já tinham bebido muito), e que tal milagre era extremamente importante para sua missão messiânica, requer um grau de desrespeito, e poucos se atreviriam a tanto. Será, porém, um testemunho da honra de Deus, e da honra e glória de Cristo, crer que Ele criou sobrenaturalmente o mesmo suco de uva que Deus produz anualmente através da ordem natural criada cf. (Jo 2.3). Portanto, esse milagre destaca a soberania de Deus no mundo natural, tornando-se um símbolo de Cristo para transformar espiritualmente pecadores em filhos de Deus (Jo 3.1-15). Devido a esse milagre, vemos a glória de Cristo “como a glória do Unigênito do Pai” (Jo 1.14; 2.11).

2) Contraria a revelação bíblica quanto a perfeita obediência de Cristo a seu Pai celestial (cf. 4.34; Fp 2.8,9) supor que Ele desobedeceu ao mandamento moral do Pai: “Não olhes para o vinho, quando se mostra vermelho… e se escoa suavemente”, i.e., quando é fermentado (Pv 23.31). Cristo por certo sancionou os textos bíblicos que condenam o vinho embriagante como escarnecedor e alvoroçador (Pv 20.1), bem como as palavras de Hc 2.15: “Ai daquele que dá de beber ao seu companheiro!… e o embebedas” cf. (Lv 10.8-11; Pv 31.4-7; Is 28.7; Rm 14.21).

3°) NOTE, AINDA, O SEGUINTE TESTEMUNHO DA MEDICINA MODERNA

a) Os maiores médicos especialistas atuais em defeitos congênitos citam evidências comprovadas de que o consumo moderado de álcool danifica o sistema reprodutivo das mulheres jovens, provocando abortos e nascimentos de bebês com defeitos mentais e físicos incuráveis. Autoridades mundialmente conhecidas em embriologia precoce afirmam que as mulheres que bebem até mesmo quantidades moderadas de álcool, próximo ao tempo da concepção (c. 48 horas), podem lesar os cromossomos de um óvulo em fase de liberação, e daí causar sérios distúrbios no desenvolvimento mental e físico do nenê.

b) Seria teologicamente absurdo afirmar que Jesus haja servido bebidas alcoólicas, contribuindo para o seu uso. Afirmar que Ele não sabia dos terríveis efeitos em potencial que as bebidas inebriantes têm sobre os nascituros é questionar sua divindade, sabedoria e discernimento entre o bem e o mal. Afirmar que Ele sabia dos danos em potencial e dos resultados deformadores do álcool, e que, mesmo assim, promoveu e fomentou seu uso, é lançar dúvidas sobre a sua bondade, compaixão e seu amor.

▪︎ A única conclusão racional, bíblica e teológica acertada é que o vinho que Cristo fez nas bodas, a fim de manifestar a sua glória, foi o suco puro e doce de uva, e não fermentado.

(Donald C. Stamps)

***
REFLEXÃO

Origem e significado da palavra vinho
Hoje a palavra vinho passou a ter um único significado, qual seja o líquido resultante da fermentação etílica da uva, ou de outras frutas, conforme pode-se observar pela definição encontrada no dicionário Michaelis:

Líquido alcoólico, resultante da fermentação do sumo da uva ou ainda de outros frutos.
Licor fermentado que se extrai dos vegetais.
Mas, cabe aqui uma análise mais profunda sobre a origem da palavra “vinho”, isto porque esta palavra não teve sempre este único significado, como fazem supor alguns.

● A palavra vinho origina-se da palavra latina vinum, que por sua vez tem origem na palavra grega oinos. Retirando-se os sufixos tem-se os radicais de cada palavra:

oin(os) = oin
vin(um) = vin
vin(ho) = vin

Nota-se assim a clara ascendência etimológica da palavra vinho, e fica patente sua origem na palavra latina vinum que tem o mesmo significado da palavra grega que a originou: oinos.

● Segundo o léxico de latim de Lewis & Short, os significados da palavra “vinum” são:

UVAS – Vinum pendens (vinho pendente), conforme encontrado na obra de Márcio Plauto, Trinummus
Videira, vinha
Vinho feito de uvas, vinho frutado.
A primeira e a segunda definições fazem a própria fruta, a uva, e a planta, a videira, serem também vinho.

No Thesaurus Linguae Latinae tem-se as definições da palavra “vinum” suportadas pelo conteúdo das obras de diversos autores clássicos. Entre estas definições duas chamam atenção: Aigleuces vinum (“vinho doce”) e Defrutum vinum (“vinho fervido”), ambas são descritas como vinhos não fermentados (não alcoólicos).

● Já o Phraseologia Generalis define a palavra latina “mustum” (mosto) como “vinho novo”, e a frase vinum pendens como “vinho ainda no pé”. Vale aqui ressaltar a definição atual da palavra mosto, conforme o dicionário Michaelis, qual seja:

▪︎ Sumo da uva, antes de se completar a fermentação.

▪︎ Suco, em fermentação, de qualquer fruta que contenha açúcar.

▪︎ Mosto virgem: sumo que corre das uvas e outras frutas, antes de serem pisadas.

▪︎ Também se nota na palavra mosto a perda do significado original que seria “o suco fresco de uvas”.

Aristóteles em seu livro Metereologica informa o sentido da palavra oinos (vinho) ao definir glukus, um suco de uvas adocicado, da seguinte forma: “embora chamado vinho (oinos), ele não tem os efeitos do vinho, apesar de ter o sabor do vinho ele não intoxica como o vinho comum”. Em outra passagem Aristóteles diz o seguinte: – “Alguns tipos de vinho (oinos), como por exemplo o mosto (gleukos), se solidificam quando fervidos”.

Na Septuaginta, tradução do Velho Testamento do hebraico para o grego, os tradutores com grande freqüência traduziram a palavra hebraica “tirosh” que significa suco de uvas fresco como oinos (vinho) sem qualquer adjetivação, mesmo havendo uma palavra que alguns poderiam afirmar ser “uma melhor tradução” para o suco de uvas fresco, no caso gleukos (mosto). Estes fatos indicam de forma inequívoca a qualquer que se proponha a estudar de forma séria esta questão que a melhor tradução para “suco de uvas recém espremido” em grego é mesmo oinos (vinho).

Assim temos demonstrado que as palavras que deram origem à palavra “vinho” devem ser interpretadas tanto como suco de uvas não fermentado, quanto como suco de uvas fermentado.

Sob esta ótica, a palavra “vinho” deveria ter este mesmo significado. Mas, o que se observa é a palavra vinho significando somente o suco de uvas com fermentação etílica. Deduz-se desta forma que em algum ponto do nosso passado houve uma mudança no significado original da palavra. O Dicionário luso-brasileiro Lello Universal traz várias definições para o vinho, sendo uma delas a do “vinho abafado” como sendo: “o vinho doce proveniente de uma fermentação parcial do mosto, sustada pelo calor, ou pelo anidrido sulfuroso ou por outro processo que não altere o valor higiênico do vinho, mas em que não intervenha a alcoolização.” Este dicionário apesar de indicar o vinho como sendo “bebida alcoólica que se obtém da fermentação, total ou parcial, do sumo de uvas frescas (mosto)” traz uma exceção, o vinho abafado, que é um vinho não alcoólico, bem como resgata o significado original de mosto: “sumo de uvas frescas”.

No dicionário Melhoramentos de 1970 e no dicionário Globo de 1956 tem-se basicamente a mesma definição de vinho encontrada hoje no dicionário Michaelis, o que indica a necessidade de posicionamento da pesquisa ainda mais no passado:

O Dicionário Prático da Língua Nacional (J. Mesquita de Carvalho) de 1945 incrivelmente não traz a descrição da palavra vinho, tão somente a da palavra vinha, indicando contudo o vinho como sendo seu cognato.

O Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa por Antenor Nascentes de 1932, indica a origem da palavra vinho na palavra latina vinum, e indica vinho como sendo, entre outros, sinônimo de videira.

No Diccionario da Lingua Portugueza de José da Fonseca (por J. I. Roquete) de 1848 encontra-se a seguinte definição de vinho: “liquor extrahido da uva”. Procurando-se no mesmo dicionário a definição da palavra liquor tem-se as seguintes definições: “1. Substância fluida e líquida; 2. Bebida espirituosa”.

DESTA FORMA A DEFINIÇÃO ORIGINAL DA PALAVRA VINHO NA LÍNGUA PORTUGUESA É:

● Substância fluida e líquida extraída da uva. Bebida espirituosa extraída da uva.
Significado da palavra hebraica yayin
A palavra hebraica yayin tem rigorosamente o mesmo significado da palavra latina vinum e da palavra grega oinos, como pode ser visto pelos seus radicais:

(ya)yin
oin(os)
vin(um)
yin = oin = vin

● A Encyclopaedia Judaica de 1971 apresenta uma descrição dos diversos usos da palavra yayin, entre eles cabe destaque a alguns que permitem que seus diversos significados fiquem claros:

▪︎ yayin mi-gat = O vinho recém espremido
antes da sua fermentação (vinho novo)

▪︎ yayin yashan = O vinho fermentado do ano anterior (vinho velho)

▪︎ yashan noshan  = O vinho fermentado com três anos ou mais (vinho muito velho)

● Tem-se que a palavra ‘yayin’ a exemplo de ‘oinos’ e vinum tanto pode ser utilizada para referenciar vinho com fermentação etílica quanto vinho não fermentado.

O VINHO NO NOVO TESTAMENTO

A crença popular de que Jesus Cristo, apesar de não ter sido um beberrão, tinha o hábito de beber moderadamente vinho alcoólico, e não só isto, mas que tenha também produzido deste vinho em grande quantidade nas bodas de Caná, tem moldado a opinião e a forma de agir de muitos cristãos quanto ao hábito de tomar bebidas fermentadas ou destiladas. A posição é esta: – “Se Cristo fez, recomendou e tomou vinho alcoólico, os cristãos devem seguir o Seu exemplo”.

AS BODAS DE CANÁ  – (João 2)

● Ao analisar esta passagem é importante ter em mente qual o objetivo de Jesus ao realizar o milagre da transformação de água em vinho, qual fosse manifestar a Sua glória como Filho de Deus e despertar a confiança dos seus discípulos na Sua capacidade de salvar o seu povo do pecado:

“Jesus principiou assim os seus sinais em Caná da Galiléia, e manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele.” (João 2:11 ACF)

● Partindo deste princípio, crer que Jesus, sabendo que os convidados já “haviam bebido muito” (v.10), criou vários litros de vinho alcoólico (entre 383,28 e 574,92 litros) desrespeitando desta forma a clara vontade de Deus, é algo além da mais desvairada imaginação:

▪︎ “Não bebereis vinho nem bebida forte, nem tu nem teus filhos contigo, quando entrardes na tenda da congregação, para que não morrais; estatuto perpétuo será isso entre as vossas gerações; e para fazer diferença entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo, e para ensinar aos filhos de Israel todos os estatutos que o SENHOR lhes tem falado por meio de Moisés.” (Levítico 10:9-11 ACF)

▪︎ “O vinho é escarnecedor, a bebida forte alvoroçadora; e todo aquele que neles errar nunca será sábio.” (Provérbios 20:1 ACF)

▪︎ “Não olhes para o vinho quando se mostra vermelho, quando resplandece no copo e se escoa suavemente” (Provérbios 23:31 ACF)

● É inimaginável o Senhor Jesus iniciar seu ministério contrariando de tal forma a vontade do Pai, e contribuindo decisivamente para a embriaguez das pessoas presentes àquela festa:

▪︎ “Ai daquele que dá de beber ao seu companheiro! Ai de ti, que adiciona à bebida o teu furor, e o embebedas para ver a sua nudez!” (Habacuque 2:15 ACF)

Os modernos pesquisadores estão alertando a respeito da síndrome fetal do álcool, que é um grupo de defeitos físicos e mentais no nascimento, resultantes do consumo de álcool durante a gravidez. Estes defeitos incluem atraso mental, déficit de crescimento, mau funcionamento do sistema nervoso, anomalias cranianas e desajustes de comportamento.

Segundo a OMS2, a cada ano, no mundo, nascem 12.000 bebês com a síndrome fetal do álcool. Alguns sintomas podem não tornarem-se óbvios até que o bebê atinja uma idade entre 3 e 4 anos, contudo, seus efeitos são irreversíveis.

E sendo Jesus Cristo o Filho de Deus, não seria questionar sua divindade, sabedoria e discernimento entre o bem e o mal afirmar que Ele teria servido vinho intoxicante em uma festa de casamento?

Fica claro aqui que o que Cristo fez foi sim o bom e puro vinho, isto é, o natural e saudável suco de uvas.

OS ODRES NOVOS

“E ninguém deita vinho novo em odres velhos; de outra sorte o vinho novo romperá os odres, e entornar-se-á o vinho, e os odres se estragarão; mas o vinho novo deve deitar-se em odres novos, e ambos juntamente se conservarão. E ninguém tendo bebido o velho quer logo o novo, porque diz: Melhor é o velho.” (Lucas 5:37-39 ACF)

Esta passagem, bem como suas correlatas em Mateus 9:17) e em Marcos 2:22), trazem em si um grande problema de interpretação. Um problema não só teológico, mas também técnico.

Uma interpretação comum é a de que somente odres novos suportariam a pressão causada pelos gases gerados pela recém iniciada fermentação do vinho novo. Isto seria devido ao fato dos odres velhos não terem mais a necessária elasticidade, rompendo-se sob pressão.

Seguindo esta linha de raciocínio, Jesus estaria sugerindo com veemência o consumo do vinho velho (com fermentação completa) por ser este melhor que o vinho novo (com fermentação incompleta), o que concorda com a maioria dos modernos enólogos.

Porém o fato é que nenhum odre, seja novo ou velho, suportaria a enorme pressão causada pelos gases gerados durante o processo de fermentação do vinho. Para este fim eram utilizados grandes jarros cerâmicos.

Uma aproximação tecnicamente correta do problema é a da utilização de vinho não fermentado. Neste caso, deveriam ser utilizados odres novos besuntados com mel para o armazenamento do vinho novo, filtrado ou fervido, sendo hermeticamente lacrados logo a seguir. Considerando se tratar de vinho novo não fermentado, caso fossem utilizados odres velhos, por mais limpos que estivessem, sempre haveria em suas paredes pequenas quantidades de matéria orgânica em decomposição, e isto seria o suficiente para iniciar um violento processo de fermentação do vinho o que com certeza romperia o odre devido à grande geração de gases.

Outra teoria é a de que o vinho novo a que Jesus se referiu seria o vinho em que o processo de fermentação estaria próximo do final, o que permitiria ao odre novo suportar a pressão gerada. Mas, neste caso, também o odre velho poderia ser utilizado pois da mesma forma suportaria a pequena pressão gerada neste ponto da fermentação.

Fica tecnicamente provado que Jesus estava falando de vinho não fermentado. Mas, se este é o caso, o que o Mestre estava tentando dizer (v.37 e 38)?

Os discípulos de Cristo são como o vinho novo e, claro, não fermentado; Sendo assim necessitam de um odre novo. Não pode haver renovação sem que sejam abandonados as tradições e procedimentos fermentados praticados até então pelos judeus. Uma nova formulação necessita ser implantada, e Cristo veio ao mundo precisamente com este objetivo. Assim para que haja renascimento espiritual é necessário arrependimento dos pecados, entrega total da sua vida ao Senhor e a conseqüente mudança na vida do pecador. Assim, para um novo vinho (novo espírito) é necessário um novo odre (novo homem). O versículo 39 traz um problema ainda maior. Este verso, se analisado de forma precipitada, traz uma aparente contradição com relação aos versos anteriores, além de aparentar estar completamente fora de contexto. Esta idéia é ainda mais reforçada quando se vê que nos textos encontrados em Mateus e Marcos não há referência alguma a esta passagem. Porém na Palavra de Deus nada está escrito por acaso, nada está fora de contexto e não há qualquer contradição.

O primeiro ponto a ser analisado é quem está dizendo que “Melhor é o velho”. Jesus? – Não. Quem diz “melhor é o velho” é aquele que já tenha bebido do vinho envelhecido. Isto se deve ao fato do ser humano ao experimentar o vinho fermentado querer mais dele. Este é o princípio básico do vício, pois, mesmo tendo ciência dos efeitos negativos do uso da substância que vicia, a pessoa quer mais.

● Mas, sendo o texto uma parábola, tem um sentido além do seu sentido imediato e direto já apresentado. Qual seja:

Jesus, como profundo conhecedor da natureza humana, sabe que é um processo trabalhoso ao homem a aceitação de mudanças. Os fariseus, a quem Jesus estava falando, tinham grande dificuldade em deixar suas velhas tradições fermentadas e desprovidas de fé, e aceitar a nova proposta feita por Cristo. Preferiam eles permanecer em seus rituais e tradições, a procurar experimentar um novo nascimento, um nascimento espiritual, o que lhes faria novos homens, vinho novo em odres novos. Daí dizerem: – MELHOR É O VELHO.

(Compilado por Israel Reis)

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