Por Chris Thomas
Artigo 1: Introdução: Por que defender 1 João 5:7?
(Com base em insights de “In Defense of the Authenticity of 1 John 5:7” [Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7], de C. H. Pappas ThM., and “A History of the Debate over 1 John 5:7-8” [Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8], por Michael Maynard M.L.S.)
A passagem comumente chamada de “Comma Johanneum” [comma joanina], encontrada em 1 João 5:7, gerou séculos de debate nos círculos acadêmicos, eclesiásticos e leigos. Em sua forma mais longa, a seção relevante de 1 João 5:7 diz: “Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um”. Para muitos cristãos, isso se destacou como uma afirmação bíblica distintamente clara da Trindade. No entanto, para outros — especialmente nos últimos dois séculos — essa passagem tem sido vista com profunda suspeita, com um número significativo de estudiosos omitindo-a de traduções modernas ou relegando-a a uma nota de rodapé.
Este primeiro artigo da nossa série apresentará os motivos pelos quais alguém deve se importar em defender 1 João 5:7. Analisaremos os argumentos que questionam sua autenticidade, as razões pelas quais muitos a sustentam firmemente como original e o significado mais amplo que esse debate tem para doutrinas tão centrais quanto a Trindade. Ao longo do texto, faremos referência aos principais argumentos apresentados por C. H. Pappas ThM., em “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7”, bem como por Michael Maynard M.L.S., em “Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8”. Essas duas obras oferecem insights históricos, teológicos e textuais detalhados sobre o que se tornou talvez o versículo contestado mais famoso do Novo Testamento.
1. O que é a Comma Joanina?
A “Comma Joanina” é simplesmente outro nome para uma leitura textual que aparece em 1 João 5:7. Embora o debate remonte a séculos, as discussões modernas frequentemente giram em torno de se a frase “no céu, o Pai, o Verbo e o Espírito Santo, e estes três são um” é genuinamente parte do texto original escrito pelo apóstolo João. De acordo com C. H. Pappas em “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7”, a passagem representa uma questão crucial de preservação divina versus corrupção dos escribas. Pappas enfatiza que este versículo não é independente, mas deve ser avaliado no contexto mais amplo de como a igreja tem lidado com as Escrituras ao longo dos séculos.
“Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8”, de Michael Maynard, oferece uma visão geral cronológica dessa disputa, destacando que os debates sobre a Comma remontam pelo menos aos primeiros manuscritos latinos e aos escritos de Pais da Igreja, como Cipriano de Cartago e Fulgêncio de Ruspe. Maynard demonstra que a questão não é apenas uma preocupação acadêmica moderna, mas um tema recorrente na história da Igreja.
2. Por que o debate é importante?
Pode-se perguntar: se 1 João 5:7 é repetido em outras declarações doutrinárias (a Trindade certamente é afirmada em outras partes das Escrituras), sua autenticidade realmente importa? A resposta é multifacetada.
Em primeiro lugar, a clareza teológica está em jogo. O versículo em questão lista explicitamente “o Pai, o Verbo e o Espírito Santo” como um só. Embora a Trindade possa de fato ser defendida à partir de outras passagens da Bíblia, como Mateus 28:19 e João 10:30, “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7” ressalta que a Comma Joanina é talvez a declaração direta mais clara de que essas três pessoas compartilham uma essência. Perder essa formulação direta pode ser visto, por alguns, como uma diminuição da clareza do testemunho bíblico da igreja sobre a triunidade de Deus.
Em segundo lugar, a doutrina da preservação das Escrituras está diretamente implicada. Michael Maynard, em “Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8”, relata como gerações mais antigas de cristãos — especialmente durante a era da Reforma — consideravam como certa a veracidade do texto grego subjacente às Bíblias tradicionais da Europa. Quando os críticos textuais modernos começaram a questionar a inclusão de 1 João 5:7, surgiram questões mais amplas: se esta passagem não era original, o que mais poderia estar em questão? Por outro lado, se é original, o processo eclesiástico que levou alguns a abandoná-la merece um exame mais aprofundado.
Finalmente, entram em jogo as implicações práticas para tradutores e pastores. Se 1 João 5:7 pertence ao texto, então as traduções modernas que o omitem estão efetivamente removendo um testemunho antigo, e possivelmente apostólico, da Trindade. Se não pertence, a presença da comma em traduções mais antigas pode ser vista como uma inserção posterior. Ambas as possibilidades moldam a forma como pastores e congregações veem a confiabilidade das Bíblias que têm em mãos.
3. Visão Geral do Contexto Histórico
Para compreender por que 1 João 5:7 é tão contestado, é preciso compreender a progressão histórica de sua transmissão, um tema central nos estudos de Pappas e Maynard:
- Referências Antigas: Como documentado por Michael Maynard, os Pais da Igreja nos séculos III e IV parecem aludir à Comma. Cipriano de Cartago (falecido em 258 d.C.) escreveu a famosa frase: “E também está escrito do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo: ‘E estes três são um’”. Críticos apontam que Cipriano pode ter se referido ao versículo 8 ou oferecido uma interpretação teológica em vez de citar uma leitura textual explícita. No entanto, Maynard vê esses testemunhos antigos como fortes evidências de que a Comma foi, pelo menos, reconhecida ou ensinada desde muito cedo.
- Manuscritos Latinos: “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7” dedica atenção significativa à preservação do versículo em manuscritos do latim antigo e da Vulgata. Jerônimo (c. 347–420 d.C.), encarregado de produzir uma Bíblia latina padronizada (a Vulgata), é central nessa história. Há argumentos de que o próprio Jerônimo incluiu a comma após vê-la em cópias gregas mais antigas ou a descobriu ausente em certos manuscritos, apenas para restaurá-la com base em testemunhos latinos.
- As Eras Medieval e da Reforma: Na Idade Média, a Igreja Latina utilizava amplamente a Vulgata, que normalmente incluía a comma. Assim, como explica Maynard, quando Erasmo produziu suas primeiras edições impressas do Novo Testamento em grego, a questão de 1 João 5:7 tornou-se um ponto crítico. Será que Erasmo a omitiu inicialmente e a restaurou somente após ser pressionado? Pappas esclarece que as decisões de Erasmo não se referiam apenas à “retro-tradução” do latim para o grego, mas sim à ponderação das evidências manuscritas disponíveis.
- Ascensão da Crítica Textual: No século XIX, estudiosos como Westcott e Hort, influenciados por descobertas como o Codex Vaticanus e o Codex Sinaiticus, passaram a omitir 1 João 5:7 do texto grego. Essa mudança teve um efeito cascata, levando muitas traduções modernas para o inglês a remover ou colocar o versículo entre colchetes. Assim, a controvérsia se intensificou sobre se manuscritos mais antigos, porém em menor número, eram mais autênticos do que a massa de manuscritos latinos ou bizantinos posteriores que incluíam a comma.
4. Principais Argumentos Contra a Comma
Críticos textuais contemporâneos frequentemente fazem as seguintes alegações, muitas das quais são resumidas por Michael Maynard em “Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8”:
- Escassez de Evidências em Manuscritos Gregos: eles enfatizam que na maioria dos manuscritos gregos — especialmente os mais antigos, como os dos séculos IV ou V — a Comma está ausente. Esta é tipicamente considerada a objeção mais forte.
- Notas Marginais Tardias: os críticos argumentam que alguns manuscritos gregos sobreviventes contendo 1 João 5:7 o fazem apenas em notas marginais ou em versões datadas do século XVI, o que sugere que o texto pode ser uma adição copista do latim para o grego.
- Silêncio Patrístico: embora alguns pais (por exemplo, Cipriano) pareçam aludir a ele, outros que escreveram extensivamente sobre a Trindade (por exemplo, Atanásio) nunca citam explicitamente 1 João 5:7. Esse silêncio é interpretado como prova de que a Comma era desconhecida em certas regiões.
Pappas, no entanto, aborda esses pontos de frente, questionando a suposição de que “mais antigo significa automaticamente mais autêntico” e observando que “sobrevivência de manuscritos” não é sinônimo de “leitura original”. Ele também destaca que pais como Atanásio não citaram todos os versículos possíveis sobre a Trindade — a omissão por si só não prova ignorância ou inexistência.
5. Principais Argumentos a Favor da Comma
Defensores de 1 João 5:7, como Pappas e Maynard, apresentam um caso multifacetado:
- Testemunho Latino: a tradição do latim antigo é notavelmente consistente na inclusão de alguma forma da Comma. Como as traduções latinas datam do século II, os defensores argumentam que a passagem deve ter existido no início da história textual da igreja ocidental. Maynard detalha como vários códices do latim antigo (por exemplo, Codex Monacensis 64, Codex Speculum e outros) apresentam a Comma como parte de 1 João, um fato difícil de explicar se a leitura foi inventada na Idade Média.
- Testemunho de Jerônimo: conforme descrito na obra de Pappas, Jerônimo supostamente criticou “tradutores infiéis” que omitiram as testemunhas no céu. Se genuíno, isso revela que a omissão da Comma, e não sua inclusão, era a anomalia na época de Jerônimo. De fato, a Vulgata de Jerônimo consolidaria a comma na cristandade ocidental por um milênio.
- Uso histórico por concílios e teólogos: concílios eclesiásticos como o de Cartago (484 d.C.) e teólogos como Fulgêncio de Ruspe citam ou apelam para 1 João 5:7 em controvérsias doutrinárias, especialmente aquelas relativas à Trindade. Maynard cita esses exemplos para argumentar que, para figuras eclesiásticas importantes, a comma não era uma leitura opcional, mas um fundamento para a ortodoxia.
- Consistência doutrinária e gramatical: Alguns defensores sustentam que o contexto circundante de 1 João 5 é gramaticalmente inadequado se a comma for removida. Eles observam a mudança entre pronomes masculinos e neutros, sugerindo que o texto foi moldado em torno da referência ao Pai, ao Verbo e ao Espírito Santo. Pappas explica que, se o texto não tiver a comma, as referências a “três que dão testemunho” se encaixam mal com a gramática que se refere apenas a “água, sangue e espírito”.
- Preservação Providencial: Além da evidência direta do manuscrito, há um argumento teológico de que Deus preservou Sua Palavra no uso majoritário da Igreja. De acordo com essa perspectiva, apresentada em “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7”, a aceitação eclesiástica de longa data da Comma é evidência de sua genuinidade, e não prova de um erro de copista amplamente propagado.
6. O Significado Mais Amplo: Doutrina Trinitária e Confiança nas Escrituras
Não se pode exagerar o peso teológico da questão. Pappas aponta como a Comma Joanina molda declarações confessionais e catecismos em inúmeras tradições cristãs. Se 1 João 5:7 for de fato autêntico, ele se apresenta como, sem dúvida, o testemunho bíblico mais direto da unidade do Deus Trino. Se for espúrio, então séculos de citações teológicas se basearam em uma interpolação.
Como Maynard indica, remover 1 João 5:7 do texto não nega a Trindade como ensinada em outros lugares. Mas a clareza e a concisão encontradas na Comma Joanina tiveram um impacto poderoso na teologia e na liturgia cristãs. Além disso, o debate se conecta à questão mais ampla de como a Palavra de Deus foi transmitida ao longo da história. Se traduções populares (como a versão King James) contiveram um versículo crucial que alguns argumentam nunca ter pertencido às Escrituras, isso pode abalar a confiança das pessoas na Bíblia. Por outro lado, se este versículo realmente pertence ao cânon, então as traduções modernas que o omitem podem estar privando os leitores de uma declaração vital da verdade.
Portanto, a questão da autenticidade torna-se não apenas um pequeno detalhe na crítica bíblica, mas um ponto crucial da teologia. Ela levanta questões sobre como o Espírito Santo guia a igreja na preservação das Escrituras, como os primeiros escribas copiaram e transmitiram textos e como a erudição moderna deve equilibrar os dados externos dos manuscritos com as evidências internas e o uso eclesiástico ao longo dos séculos.
7. Contraponto: A Trindade pode subsistir sem 1 João 5:7?
Uma objeção comum, mesmo daqueles que simpatizam com a Comma, é que o restante do Novo Testamento fornece uma base sólida para a natureza Trina de Deus, tornando 1 João 5:7 teologicamente não essencial. De fato, pode-se articular uma forte doutrina do Pai, do Filho e do Espírito Santo como co-iguais e co-eternos a partir de passagens como Mateus 3:16-17, João 1:1, João 10:30 e Mateus 28:19.
Ainda assim, Pappas observa que uma questão distinta surge aqui. A questão não é se a Trindade subsiste ou cai com base na presença de um versículo, mas se a igreja tem lido uma cópia precisa das palavras de João por quase dois milênios. Maynard observa, de forma semelhante, que, embora a Trindade não esteja em perigo, a inerrância bíblica e a preservação providencial podem estar. Os defensores da Comma estão apenas se apegando à tradição ou estão defendendo um texto verdadeiramente original?
8. Olhando para o Futuro nesta Série
Nos próximos artigos, examinaremos sistematicamente a defesa histórica de 1 João 5:7, o uso que dela fizeram os primeiros pais da igreja, evidências encontradas em antigos manuscritos latinos, o envolvimento da Vulgata de Jerônimo e como ela foi transmitida através das tradições medievais até a era de Erasmo, a Poliglota Complutense e, eventualmente, a Reforma. Também abordaremos em profundidade:
- Como Cassiodoro, Fulgêncio e outros escritores latinos citaram explicitamente a Comma.
- O papel de vários concílios e sínodos que invocaram 1 João 5:7 em declarações teológicas.
- A aceitação da Comma pela Reforma Protestante e as controvérsias textuais que ela gerou.
- Os valdenses e outros grupos pré-Reforma que supostamente preservaram a Comma.
- Argumentos críticos textuais modernos que permanecem altamente céticos quanto à sua autenticidade.
Ao final desta série, teremos revisado as extensas evidências apresentadas por Pappas e Maynard. Veremos que o debate está longe de ser uma disputa mesquinha e obscura entre especialistas; em vez disso, ele aborda aspectos cruciais de como lemos, interpretamos e defendemos a Bíblia.
9. Conclusão
A primeira parte do nosso exame de 1 João 5:7 (a Comma Joanina) nos deixa com um lembrete importante: crítica textual, teologia e história da igreja estão profundamente interligadas. Como visto em “Em Defesa da Autenticidade de 1 João 5:7”, de C. H. Pappas ThM, e “Uma História do Debate sobre 1 João 5:7-8”, de Michael Maynard M.L.S., discutir este único versículo é descascar camada após camada de manuscritos, desenvolvimentos doutrinários, debates eclesiásticos e filosofias tradutórias que abrangem séculos.
Longe de ser uma preocupação desprezível, a autenticidade de 1 João 5:7 aponta para questões maiores sobre como as Escrituras Sagradas foram copiadas, preservadas e, às vezes, contestadas. Para os defensores, a Comma se destaca como uma joia divinamente preservada que afirma a unidade trinitária com uma franqueza incomparável. Para os céticos, representa um exemplo instrutivo de como as tradições eclesiásticas podem incorporar leituras não originais em séculos de ensino cristão.
Por que defender 1 João 5:7, então? Porque compreender as origens, o uso e a transmissão deste versículo contestado faz mais do que resolver uma única variante textual. Ele destaca como os crentes ao longo da história da igreja lutaram com o texto bíblico — às vezes sob intenso escrutínio, às vezes em meio a conflitos teológicos — e como emergiram com uma Bíblia que consideram ser a Palavra de Deus. A questão que continuaremos explorando é se essa Palavra de fato inclui a Comma Joanina, como escrita pelo Apóstolo João, ou se foi uma inserção posterior e piedosa que ganhou força extraordinária.
Tanto Pappas quanto Maynard nos convidam a explorar a consistência interna, o testemunho histórico e a importância teológica da Comma. Nas próximas partes, nos aprofundaremos nas primeiras testemunhas — como Tertuliano e Cipriano — que parecem citá-lo ou aludir a ele, nos manuscritos em latim antigo que o preservam, na Vulgata de Jerônimo e em seu famoso Prólogo, e muito mais. Ao final da jornada, o objetivo não é apenas avaliar a autenticidade deste versículo, mas também aprofundar nossa apreciação pela notável história de como as Escrituras chegaram até nós, palavra por palavra, versículo por versículo, ao longo dos séculos.
Fonte: <https://confessionalbibliology.com/2025/01/10/the-comma-johanneum-part-1/>
Traduzido em português por Ícaro Alencar de Oliveira. Rio Branco, Acre: 18 de agosto de 2025.






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