Por Robert J. Sargent – pastor da Igreja Batista Bíblica em Oak Harbor, Washington. O artigo acima foi extraído de “Things Hard to be Understood” [Coisas Difíceis de Entender], de David Cloud, Way of Life Literature (http://wayoflife.org), 2001.

Publicado em The Burning Bush. Vol. 10. N. 2 (julho de 2004).


Textos em Questão

2 Reis 8:26 – “Era Acazias de vinte e dois anos de idade quando começou a reinar, e reinou um ano em Jerusalém; e era o nome de sua mãe Atalia, filha de Onri, rei de Israel.”

2 Crônicas 22:2 — “Era Acazias da idade de quarenta e dois anos, quando começou a reinar, e reinou um ano em Jerusalém; e era o nome de sua mãe Atalia, filha de Onri.”

Há alguma discrepância entre 2 Reis 8:26 e 2 Crônicas 22:2? Para o leitor casual, parece haver, de fato, uma contradição entre dois relatos paralelos da ascensão do rei Acazias sobre Judá. Acazias tinha 22 ou 42 anos quando ascendeu ao trono de Judeia?


A Solução “Acadêmica”

Há uma solução fácil para o problema — se você for um corretor da Bíblia! Obviamente, isso só pode ser um erro! A declaração “acadêmica” dessa “explicação” é: “O número ‘quarenta e dois’ em 2Cr. 22:2 é evidentemente o erro de um copista”. Em outras palavras, como Jeorão, pai de Acazias, morreu aos 40 anos (2Cr. 21:20), teria sido impossível para Acazias sucedê-lo aos 42 anos! Portanto, em algum momento da história da transmissão do texto hebraico, um escriba descuidado cometeu um erro de transcrição.

O problema com essa solução fácil é que: se há algum erro na Bíblia (ainda que um lapso inocente), quem é que pode afirmar que não há outros erros na Bíblia? Como podemos ter absoluta certeza de que os preciosos versículos que Deus usou para falar ao nosso coração e salvar nossa alma não estão entre aqueles que contêm erros? Podemos realmente confiar em nossa Bíblia?

Por uma série de razões convincentes, cremos que a Bíblia é a Palavra Perfeita (Sl 119:140) de um Deus Perfeito (Tt 1:2), dada ao homem de Maneira Perfeita (2Pe 1:21; 2Tm 3:16) e preservada em Forma Perfeita (Sl 12:6-7). Nossa Bíblia não é apenas infalível em todos os seus ensinamentos, mas também inerrante em todo o seu conteúdo. É por isso que podemos dizer com plena certeza: “Eu sei em quem tenho crido”; é por isso que podemos dizer com absoluta confiança: “nem uma só palavra falhou de todas as suas boas promessas”.

(I) Algumas partes da Palavra de Deus são comparadas ao leite (1Pe 2:2), enquanto outras são chamadas de alimento sólido (Hb 5:12-14). Este enigma definitivamente se enquadra na categoria de alimento sólido.

(II) Todo cristão é ordenado a estudar a Bíblia (2Tm 2:15). Esta questão em particular requer um estudo muito cuidadoso e diligente.

(III) Sempre que nos deparamos com uma passagem bíblica difícil de entender, isso não significa que a Bíblia esteja de alguma forma errada. Temos que considerar duas realidades:

(1) que talvez não tenhamos maturidade espiritual suficiente para compreender o profundo tesouro que Deus colocou em Sua Palavra (1Co. 3:1–2, Lc. 24:25) e, portanto, precisamos continuar crescendo e estudando; ou

(2) que Deus nunca pretendeu que soubéssemos tudo o que há para saber (Jo. 21:25) e, portanto, devemos nos contentar com o conhecimento de que Ele nos deu tudo o que precisamos saber até entrarmos em Sua gloriosa presença no céu (1Co. 13:12).

(IV) As duas passagens em questão são traduções precisas para o inglês do texto hebraico massorético — todos os manuscritos hebraicos existentes dizem a mesma coisa! Não se trata de uma suposta “tradução ruim” feita pelos tradutores da Versão Autorizada do Rei James. Ora, esses homens fariam malabarismos com os eruditos do século XX — e você não acha que eles teriam tido o bom senso de “consertar” uma inconsistência tão gritante se realmente acreditassem que era um erro? (Essa pergunta desconcertante é, na verdade, uma demonstração maravilhosa da honestidade dos tradutores da Versão Autorizada do Rei James.)

(V) Ao interpretar a Bíblia cronologicamente (o que é parte da solução para esses textos problemáticos), é absolutamente necessário ter em mente alguns fatos importantes:

(1) As Escrituras tratam apenas de anos inteiros quando se trata do reinado dos reis. Uma parte de um ano é contada como um ano inteiro e, quando aplicada aos reis de Israel, essa parte do ano pode, na verdade, ser contada duas vezes — uma para o rei cessante e outra para o rei entrante. De fato, na época dos eventos mencionados em nosso texto problemático, o reino do Norte de Israel tinha três reis reinando no mesmo ano — Acabe (ausente em batalha e depois morto), seu filho Acazias (co-rei, que morre em uma queda) e seu neto Jeorão.

(2) Às vezes, o reinado de um rei é datado a partir do início de uma dinastia, em vez do início de sua própria sucessão ao trono. O exemplo clássico disso é encontrado em 2 Crônicas 16:1, onde o reinado de Asa, na época da invasão de Baasa, foi contado a partir da divisão da monarquia unida sob Roboão. (Isso explica a aparente contradição com 1 Reis 16:8.) Crônicas registra a duração do reino; Reis registra a duração do mandato. Podemos achar essa uma forma estranha de cálculo, mas é assim que às vezes é contado no registro bíblico.

(3) Às vezes, o início do reinado de um rei pode ser dado a partir de sua unção ou de sua ascensão, ou ambos! O Senhor Jesus Cristo nasceu Rei dos Judeus (Mt 2:2), mas Seu reinado não começará até que Ele se assente no trono de Davi no Milênio. Após a deportação de seu pai, Joaquim tornou-se legalmente rei de Judá quando tinha oito anos de idade (2 Crônicas 36:9), mas sua mãe governou em seu lugar como rainha (Jr 13:18) até os 18 anos (2 Reis 24:8). Três meses depois, tanto o rei quanto a rainha-mãe foram deportados (2 Reis 24:12).

(4) Não era incomum que houvesse mais de um rei reinando ao mesmo tempo em Israel ou Judá. Alguns governavam como pró-Rex (no lugar do rei), outros como co-Rex (junto com o rei).

(VI) O termo “filho”, como usado na Bíblia, nem sempre significa o descendente masculino contíguo de um pai. Um pai pode, na verdade, ser o avô (Dn 5:2 — Belsazar era neto de Nabucodonosor), padrasto ou um antepassado distante (Mt 1:1).

(VII) Esta questão em particular é um tanto complicada pela semelhança dos nomes dos reis de Israel e Judá durante o mesmo período. De fato, havia dois Acazias, um no reino do norte de Israel e outro no reino do sul de Judá. Uma maneira de mantê-los claros em sua mente é lembrar-se da seguinte fórmula: ISRAEL = A-A-J (Acabe-Acazias-Jeorão); JUDÁ = J-J-A (Josafá-Jeorão-Acazias). Por fim, Acazias tem três nomes nos registros: Acazias (2Cr. 22:1), Jeoacaz (2Cr. 21:17) e Azarias (2Cr. 22:6).


A Solução Bíblica

A “chave” que abre a porta para a nossa compreensão deste assunto encontra-se no Novo Testamento. A genealogia real do Senhor Jesus Cristo está registrada no Evangelho segundo Mateus. Mateus 1:8, lista os reis da linhagem davídica na época de nossa preocupação específica — e há algumas omissões notáveis!

O gráfico a seguir compara os reis de Judá, conforme constam no registro do Antigo Testamento, com os mesmos reis listados em Mateus 1:8:

REGISTRO DO VTGENEALOGIA DE JESUS
AsaAsa
JeosafáJeosafá
JeorãoJeorão
Acazias
Joás
Amazias
UziasUzias

Três reis de Judá não são contados na linhagem de Jesus Cristo! Por quê? A resposta para isso se encontra em Êx. 20:5, Nm. 14:18 e Sl. 109:13-15 e se manifesta no caráter deste reinado (2Cr. 22:2-4). O fato é que Acazias não é contado como descendente de Davi — sua ascendência remonta à casa de Onri. A Bíblia enfatiza tanto a linhagem quanto a influência de sua mãe (Atalia), que é filha de Onri — seja literalmente, seja no sentido de que ela é filha de Acabe e Jezabel (2Rs 8:18), ou seja, ela é neta de Onri.


Duas Explicações Possíveis

Sendo assim, existem agora duas explicações possíveis:


Solução nº 1

Acazias tinha literalmente 22 anos (2Rs 8:26) quando ascendeu ao trono de Judá. Ele era filho de Jeorão e Atalia.

Acazias foi co-rei com seu pai doente, Jeorão (2Cr. 21:18), por um ano (2Rs 9:29 — o 11º ano de Jeorão de Israel) e rei único por um ano (o 12º ano de Jeorão de Israel — 2Rs 8:25).

Acazias ascendeu ao trono em 894 a.C. [Ed.: 842/1 a.C.]. Se contarmos 42 anos para trás (até 936 a.C.), chegamos ao primeiro ano de Onri [Ed.: 885/4 a.C.]. Em outras palavras, Acazias tinha de fato 22 anos (como consta em Reis), mas seu reinado é contado (em Crônicas) a partir do início da dinastia maligna de Onri. Esta é a maneira do Espírito Santo destacar a aberração perversa na linhagem real davídica.

A frase “quarenta e dois anos” pode então ser interpretada como uma expressão idiomática hebraica “um filho de quarenta e dois anos” — significando que se passaram 42 anos desde o início da dinastia fundada por Onri.


Solução nº 2

Acazias tinha literalmente 42 anos (2Cr 22:2) quando ascendeu ao trono de Judá. Portanto, ele não era filho literal de Jeorão (que morreu aos 40 anos), mas sim um filho no sentido de enteado. Sua mãe era esposa de seu pai.

Se recuarmos 20 anos (até quando Acazias tinha 22 anos — 2 Reis 8:26), chegamos ao ano 914 a.C. [Ed.: 862/1 a.C.], que é o oitavo ano de Josafá. Foi mais ou menos nessa época que Josafá “aparentou-se com Acabe” (2Cr 18:1), pois sabemos que no terceiro ano do reinado de Josafá ele instituiu um reavivamento em Judá (2Cr 17:7-9), após o qual seu reino prosperou (2Cr 17:12).

Lemos em 2 Crônicas 18 que, vários anos após essa aliança ter sido firmada, Acabe e Josafá se envolveram em uma empreitada militar conjunta contra a Síria (2Cr 18:2). Ambos os reis entraram em batalha (2Cr 18:28) e Acabe foi morto (2Cr 18:33-34). Antes da batalha, o fiel profeta Micaías foi deportado acorrentado para Amom, onde Joás (de um ano de idade) residia (1Rs 22:26). É aqui, nesta passagem, que temos uma declaração muito reveladora: Joás — o filho biológico de Acazias (2Cr 22:11) — é chamado de “filho do rei”, indicando que Acazias já era rei! Como isso poderia ser possível? Se, como parte da afinidade que Josafá tinha com Acabe, Acazias foi ungido rei nessa época, as peças do quebra-cabeça começam a se encaixar.

Em outras palavras, Acazias foi ungido rei aos 22 anos — ele finalmente sentou-se no trono de Judá 20 anos depois, aos 42 anos.

A Palavra de Deus não fornece todos os detalhes da afinidade entre os dois monarcas. Evidentemente, ela era abrangente, pois em 2Cr 21:2, Josafá recebeu o título de “rei de Israel!”. Além disso, quando Jeorão, filho de Jeosafá, finalmente conquistou o governo exclusivo de Judá, ele não apenas assassinou seus irmãos, mas também “vários príncipes de Israel” (2Cr 21:4). Por que ele faria isso se eles não fossem uma ameaça ao trono de Judá?

Além disso, Acazias obviamente se sentia “em casa” na corte israelense (2Cr. 22:6). Talvez ambos os reis estivessem interessados em reunificar a monarquia, que havia sido dividida por cerca de 70 anos — sem dúvida, com motivos diferentes. Acabe (ou Jezabel!) conspirou para instalar um dos seus no trono da Judeia após a morte de Josafá — uma manobra que seria realizada ao designar Acazias (cuja mãe era filha de Acabe) com antecedência. Quando o plano de Acabe de matar Jeosafá em batalha saiu pela culatra (2Cr 18:29, 31-33), Acazias teve que esperar 20 anos para ser entronizado.

Dessa forma, Acazias tinha 22 e 42 anos quando começou a reinar — 22 quando foi ungido e 42 quando foi assentado.

A única questão que permanece é: Quem era seu pai biológico? A afinidade estabelecida entre Acabe e Josafá parece ser um tanto sórdida — uma teia emaranhada, na verdade! Considere que Acazias é dito ser:

(1) Filho de Jeorão (2Cr 22:1). Como Acazias era dois anos mais velho que seu “pai” Jeorão, ele deve ter sido seu enteado, tendo se relacionado com sua mãe Atalia quando ela se casou com Jeorão.

(2) Genro da casa de Acabe (2Rs 8:27). Esse parentesco teria sido estabelecido por seu casamento com Zíbia (2Cr 24:1), que deve ter sido filha ou neta de Acabe.

(3) Filho de Jeosafá (2Cr 22:9). Parece que Acazias recebeu um sepultamento decente apenas por respeito ao fato de ser filho de Josafá (2Cr 22:9). Será que, em tempos anteriores, Josafá seguiu o costume de cimentar os laços reais (1Rs 3:1) ao se aproximar de Atalia, filha de Acabe? Talvez seja neste ponto que o registro bíblico deixa de fornecer detalhes suficientes para que alguém tenha certeza.

O Deus Todo-Poderoso nunca se agrada de alianças profanas (2Co 6:14-17). O Senhor nunca reconheceu os reinados de Jeorão e Azarias, que buscaram introduzir o culto a Baal na Judeia — juntamente com Joás, eles são omitidos da genealogia do Salvador. Quando Acazias morreu, o próprio Deus cortou a casa de Acabe da linhagem real (2Cr 22:7-9).

Fonte: <https://www.febc.edu.sg/article/def_scribal_error_in_2chron22>

Traduzido em Português por Ícaro Alencar de Oliveira. Rio Branco, Acre: 20 de agosto de 2025.

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